Por Luiz Mário Bratti*
A despeito do disposto no art. 20 do Código de Processo Civil e do entendimento então predominante, sempre sustentei, mesmo antes da edição da Lei nº 8.906/94 (EAOAB), que os honorários advocatícios decorrentes da sucumbência pertenciam, como de fato pertencem, única exclusivamente ao advogado da parte vencedora (Jurisprudência Catarinense, Volume 53, pág. 43/55).
Com o advento do atual EAOAB, tal questão ficou totalmente superada, haja vista do disposto no respectivo art. 23 e a própria jurisprudência do nosso Eg. Tribunal de Justiça e do próprio Superior Tribunal de Justiça.
Com efeito, dispõe o mencionado dispositivo legal que “os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor”.
Por isso, a Eg. Corte de Justiça de Santa Catarina tem decidido, reiteradamente, que “os honorários pertencem ao advogado, a teor do EOAB (Lei n. 8.906/94, art. 23)…” (AC nº 2009.028505-2, rel. Des. João Henrique Blasi; julg. em 23/06/2009).
Já o Eg. Superior Tribunal de Justiça assentou que “no direito brasileiro, os honorários de qualquer espécie, inclusive os de sucumbência, pertencem ao advogado, e o contrato, a decisão e a sentença que os estabelecem são títulos executivos”, razão pela qual, “tratando-se de direito autônomo, o advogado é parte legítima para defender os honorários que titulariza quando ameaçados em razão da propositura de demanda rescisória” (AgRg na Ação Rescisória nº 3290, rel. Min. Castro Meira; julg. em 25/05/2011).
No entanto, o mesmo Superior Tribunal de Justiça, que afirma que os honorários advocatícios decorrentes da sucumbência pertencem ao advogado da parte vencedora, e, inclusive, que os mesmos têm natureza alimentar (REsp nº 608.028/MS), equivalentes ao salário do trabalhador (REsp nº 566.190/SC), tem decidido, reiteradamente, que, em havendo sucumbência recíproca, os respectivos honorários, em face do disposto no art. 21 do Código de Processo Civil, devem ser compensados.
Tal entendimento, aliás, encontra-se consolidado perante aquele Superior Tribunal de Justiça, tanto que objeto da Súmula nº 306: “os honorários advocatícios devem ser compensados quando houver sucumbência recíproca, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo, sem excluir a legitimidade da própria parte”.
Todavia, mais uma vez, ouso discordar desse r. entendimento.
Com efeito, de uma banda, dispõem expressamente os artigos 368 e 369 do Código Civil que, somente, “se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra” (CC, art. 368) e quando essas obrigações forem “(…) líquidas, vencidas e de coisas fungíveis” poderá haver a sua compensação.
Vale dizer: somente quando líquidas e vencidas, portanto, exigíveis, duas ou mais obrigações existentes entre duas pessoas que, ao mesmo tempo, forem credora e devedora uma da outra, é que se poderá cogitar da sua compensação.
O atualíssimo SÍLVIO DE SALVO VENOSA ensina que “compensar é contrabalançar, contrapesar, equilibrar, estabelecer ou restabelecer um equilíbrio. No direito obrigacional, significa um acerto de débito e crédito entre duas pessoas que têm, ao mesmo tempo, a condição recíproca de credor e devedor, uma conta de chegada, em sentido vulgar. Os débitos extinguem-se até onde se compensam, isto é, se contrabalança, se contrapõem e se reequilibram. É um encontro de contas. Contrapesam-se dois créditos, colocando-se cada um em um dos pratos da balança. Com esse procedimento, podem ambos os créditos deixar de existir, ou pode subsistir parcialmente um deles, caso não exista contrapeso do mesmo valor a ser sopesado. É a noção primeira dada pela lei: “se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem” (art. 368)” (DIREITO CIVIL, II Volume, 9ª Edição, pág. 267).
A seguir, estabelece os requisitos do instituto da compensação: “a reciprocidade de créditos; a homogeneidade das prestações; a liquidez, certeza e exigibilidade e a existência e validade do crédito compensante” (ob. cit., pág. 270).
Ao comentar os mencionados dispositivos legais, o renomado SÍLVIO RODRIGUES assevera que, “portanto, a compensação aparece como um meio de extinção das obrigações e opera pelo encontro de dois créditos recíprocos entre as mesmas partes. Se os créditos forem de igual valor, ambos desaparecem integralmente; se forem de valores diferentes, o maior se reduz à importância correspondente ao menor. Procede-se como se houvesse ocorrido pagamento recíproco, subsistindo a dívida apenas na parte não resgatada” (CÓDIGO CIVIL, Volume 2, pág. 209).
Logo adiante, enumera os pressupostos do instituto da compensação, a saber: “a) reciprocidade das obrigações; b) liquidez das dívidas; c) exigibilidade atual das prestações; d) fungibilidade dos débitos” (ob. cit., pág. 215).
Ao discorrer sobre cada um dos requisitos, ambos os SÍLVIOS afirmam que: a) a compensação só pode ocorrer em relação a obrigações recíprocas, de uma parte ante a outra, não se incluindo obrigações de terceiros; b) que tais obrigações sejam líquidas, atuais ou vencidas, portanto, exigíveis desde logo e fungíveis ou homogêneas, i. e., da mesma espécie ou natureza (idem, idem).
Ora, se os honorários sucumbenciais pertencem ao advogado da parte vencedora, ainda que proporcionais à vitória de cada uma delas, resta evidente e lógico que, não sendo os respectivos advogados, nem devedores, nem credores, um do outro, mas, apenas credor da parte contrária vencida, como falar em compensação dos seus honorários com os honorários do advogado da outra parte?
A resposta tem sido dada pelo Eg. Tribunal de Justiça de Santa Catarina para quem, feliz e acertadamente, a compensação dos honorários advocatícios é simplesmente inadmissível (Apelações Cíveis nºs 2005.024829-6, 2006.045599-7 e 2006.043845-8, 2007.058444-2, 2009.032687-7, 2010.087361-7, 2011.013847-5, 2012.038400-6).
Aliás, a Eg. Quarta Câmara de Direito Comercial do Eg. Sodalício catarinense, reexaminando recurso de apelação em razão de o acórdão da Câmara haver contrariado a orientação atualmente adotada pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça, foi mais longe, decidindo que mesmo que a orientação Corte Especial daquele Superior Tribunal de Justiça, ao julgar recurso repetitivo (art. 543-C do CPC), é no sentido de que os honorários advocatícios devem ser compensados, na ocorrência de sucumbência recíproca, a “Câmara ratifica o entendimento exposto no voto anterior de que a verba honorária não pode ser compensada” (AC nº 2009.045733-0, rel. Des. Lédio Rosa de Andrade; julg. em 31/05/2011).
Florianópolis, 12 de julho de 2012.